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LITERATURA DE CORDEL  - Poesia brasileira

A obra literária que conta histórias através de rimas.
Também conhecido como folhetos, eles eram vendidos em feiras, bancas e mercados. O nome de cordel é original de Portugal, que tinha a tradição de pendurar folhetos em barbantes.

Muito cultivada e disseminada em feiras do Nordeste do Brasil.  

 

JOSÉ SOARES

(Paraíba – Brasil )

 

O poeta paraibano José Francisco Soares, (1914 – 1981), se especializou no viés jornalístico da literatura de cordel e, podemos afirmar que foi o maior poeta desse gênero no Brasil, daí ter recebido a alcunha de “o poeta repórter”. Suas obras foram centradas na notícia, lia vários jornais diariamente, além de ouvir programas de rádio para manter-se no foco dos principais acontecimentos do município, cidade, estado, país e do mundo. Desde a infância estava mergulhado na literatura de cordel, tinha familiares envolvidos com a composição poética, como seu primo, o violeiro Agostinho Lopes dos Santos e seu tio Inácio da Catingueira, um dos mais célebres cantadores do Nordeste de todos os tempos. Quando criança passou mais tempo nas feiras e mercados, fazendo biscates e ouvindo os cantadores e poetas.

*

Publicou seu primeiro folheto aos 14 anos, intitulado Descrição do Brasil por estados. Aos quinze anos fica órfão de pai e mãe e se vê responsável pelos irmãos e todo o sustendo da família. Poeta como Manuel D'Almeida Filho e Manoel Camilo dos Santos foram grandes incentivadores do jovem poeta. Como era difícil viver só de poesia, trabalhou em várias atividades, mas dedicou-se mais à de pedreiro, em Recife, Rio de Janeiro e Niterói, entre outras cidades.

Em 1958, alugou um espaço ao lado do Mercado São José, em Recife, para instalar sua banca de revistas, para a qual deu o nome de Barraca Tricolor, em homenagem ao seu time do coração, o Santa Cruz. Dessa forma pode se abastecer de notícias para a criação de seus versos e venda de folhetos. Em 1969, torna-se editor de folhetos, estabelecendo a Gráfica Tricolor, em Casa Amarela. Constituiu uma ampla rede de distribuidores por todo o nordeste.

O texto completo pode ser lido em:

http://cordeldesaia.blogspot.com 

 

LITERATURA DE CORDEL. Antologia  Volume 1.  [org. por]  Manuel Florentino Duarte – José Costa Leite – José Soares. Ilustrado com xilogravuras.  São Paulo: Global Editora, 1976.  168 p.  ilus. 
12 x 20 cm                                              
Ex. bibl. Antonio Miranda 

 

A MULHER QUE DEU A LUZ A UM SATANAZ

Em Santo André de São Paulo
a dias do mes passado
deu-se um fenômeno intrigante
que deixou-me horrorizado
no hospital de São Bernardo
muita gente encabolado.

Conforme li em manchete
nas colunas dos jornais
uma senhora doméstica
vivendo na santa paz
ficou grávida e de repente
deu a luza a um SANTANAZ

No hospital de São Bernardo
pertinho de Santo André
a sete do mes passado
nasceu ali um bebê
que só a própria natureza
pode explicar como é

Os médicos apavorados
naquela situação
diante de um fenômeno
que não tinha explicação
não sabiam distinguer
se era um bebê ou um cão

Santo André, São Bernardo
movimentou-se damais
chegaram quientos diabos
mandado por capataz
pra visitar o bebê
o mais novo SANTANAZ

Dizem que o satanás
era preto e muito forte
mais não tinha experiência

Foi sequestrado pró norte
não chegou aqui ainda
porque não tinha transporte

Dizem que a mãe do monstro
quase que perdeu o tino
procurava não sabia
quem era o pai do menino
a partir dessa premissa
começou seu desatino

Em vez de ir para um médico
procurou um xangoceiro
não acreditava em Deus
chamou um pai de terreiro
dizendo que dava ponto
a quem é catimbozeiro

O xangoseiro lhe disse
eu sou um deus pequenino
na magia negra sou
um espírito bisantino
preparava um banho sagrado
matava log o menino

a mulher foi na conversa
mais disse não vou querer
vê meu filho nascer morto
como acabou de dizer
não quero vê ele morto
deixe esse DIABO crescer

Vivo no mundo sosinha
sem marido e sem conforto
mais faço tudo no mundo
para evitar um aborto
ainda sendo um SANTANAZ
não quero que nasça morto

Aqui no inferno vivo
ninguém olha meu sofrer
todos olham minha vida
não vêm meu padecer
um dia terei descanço
quando esse DIABO nascer

Quando o menino nasceu
foi a maior explosão
nasceu com os pés prá frente
e um bilhete na mão
os olhos da coar de fogo
e um rabo varrendo o chão

Tinha os traços do demônio
parecia o CAPATAZ
o umbigo era nas costas
fedia a pólvora com gás
não tinha dúvida nenhuma
era o puro Satanáz

 

Quando nasceu foi dizendo
minha gente eu vim mandado
o meu avô CAPATAZ
mandou trazer um recado
e quando fosse levasse
os espíritos endiabrados.

Disse que lá tem emprego
prá quem usa mini-saia
vestido lascado atraz
blusa tomara que caia
e com meio metro de pano
faz o casaco a saia

Falou que levasse moça
que anda fora de hora
usando uma frente única
um sinto tora não tora
cobrindo somente os seios
o resto tudo de fora

É esses moços só no nome
que gosta de gafieira
sogra que namora genro
mãe de moça alcoviteira
viúva que casa logo
e mulher casa gaieira

disse que tem uma vaga
para espírito maligno
sujeito falsa bandeira
asilado de cassino
e mulher que toma remédio
pr
á não nascer o menino

mandou levar as mariposas
que passeiam quase nua
se oferecendo aos homens
que encontram pela rua
sem respeito as esposas
sem vergonha e seminua

perguntaram o nome dele
ele disse é CAI-ACANGA
eu também quero levar
mulher que anda de tanga
com sobrancelhas raspada
parece mais uma franga

ele disse lá é bom
trabalha dentro de casa
o transporte é uma jóia
o carro á não atrasa
e o trabalho é maneira
engolir espeto e brasa

além disso se descança
lá você dorme a vontade
dorme num colchões de fogo
com toda tranquilidade
na mesma cama que dorme
o compadre e a comadre

no inferno já tem luz
dorme com a luz acesa
fizeram um inferno novo
agora é uma beleza
e tem luz nas casa do cão
que mora na redondeza

fizeram lá uma igreja
o diabo fala em jesus
tem mais uma capelinha
de nossa senhora da luz
o cão aprendeu a ler
perdeu o medo da cruz

os pais da mãe desse monstro
humilde e bom companheiro
não sei seu nome completo
me contou um cambiteiro
mora no sítio de seu Celso
no subúrbio de BARREIROS

Já recontei a história
do geito que foi passada
conforme noticiário
impressa, escrita e falada
aumentei alguma coisa
prá ficar mais engraçada.

 

*

Página publicada em março de 2022


 

 

 
 
 
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